Fronteiras, muros e os outros


25/04/2016



Em tempos de globalização, viveríamos todos hoje em uma espécie de aldeia global em que os fluxos financeiros e de informação acontecem em velocidades que a mente humana mal consegue conceber e em que as relações ignoram os limites entre os territórios e dispensam a mediação das autoridades tradicionais.

Isso é apenas em parte verdade.

A cada instante, se prestarmos atenção, seremos lembrados de que vivemos em um pedaço do mundo, cercado por aduanas e controles de passaporte, sob a autoridade de um sistema jurídico, de juízes e de polícia.

E quando levantarmos o olhar para o cenário internacional veremos ainda operar um ordenamento do mundo em que os Estados são os operadores das normas e das instituições, e de grande parte da política.

As fronteiras permanecem, portanto. E mais, lá onde vinham sendo abandonadas, bastou que uma onda de refugiados se anunciasse para que voltassem em força.

Apenas em alguns sentidos os Estados podem não ser os detentores do poder e as fronteiras podem não importar.

Há, ao que parece, um poder capaz de suplantar inclusive o das grandes potências e instrumentalizar o funcionamento do direito e das instituições. Um poder que pensa o mundo inteiro como a arena de seus negócios e de seus jogos. Alguém poderia dar-lhe o nome de Grande Capital.

E há, ao que parece também, uma revolução permanente no campo das comunicações e das redes que conectam todos com todos.

E no entanto, paradoxalmente, a tecnologia que torna possível o encontro e o comunicar serve em igual medida a isolar e separar, quando vai transformando o virtual em canal quase exclusivo de troca – quando não sabemos dar bom dia ao nosso amigo virtual se o virmos em carne e osso.

Mais grave ainda, a revolução nas comunicações e o pretenso desfazimento das fronteiras não parecem fazer nada para o fechamento dos fossos que separam os grupos humanos, para o desarme das barreiras que se erigem entre e eu e o outro.

Essas revoluções nos fazem viver por um breve momento a ilusão de uma humanidade uniformizada, trilhando unida a senda de uma civilização em que poder, e querer, consumir é o sinal supremo do pertencimento.

Em todos os lugares, enquanto isso, estamos ocupados construindo muros que separem os desiguais. Nas cidades, para protegê-las de suas periferias pobres e violentas. No mundo desenvolvido, para barrar os imigrantes e os refugiados. Na esplanada, para separar os cidadãos que pensam diferentemente e apenas por isso já não podem conviver.

As barreiras se multiplicam para criar espaços exclusivos em que cada um só tenha que conviver com seus iguais.

E é para isso também que em alguns lugares as fronteiras reganham força e há quem queira multiplicá-las.

Não é esta afinal a receita de tantos para um novo Oriente Médio em que, feita a prova de que os diversos grupos étnicos e religiosos não saberiam conviver em paz, o melhor seria a criação de novos espaços territoriais em que cada um compartilharia o Estado apenas com o seus?

Ali, nos dizem alguns, a convivência entre muçulmanos, cristãos e judeus, entre árabes, kurdos e turcomanos, apesar de real por mais de um milênio, não é natural, não pode ser. Novas fronteiras são concebidas, que corresponderiam às nacionalidades exclusivistas e excludentes.

Não, as fronteiras não morreram.

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